«(...) A brisa, o brilho do dia, há qualquer coisa que tem de repente o odor e a memória de não sei que paraísos. A música inventa-nos um passado que não conhecemos, disse alguém. Também os aromas, a Primavera, as nuvens nos levam de repente a um passado que não conhecemos. Basta inspirar profundamente para fazer emergir do fundo da terra ou do fundo da memória um tempo que está fora do tempo, uma felicidade impossível de recordar. Dela temos apenas a memória: nunca tivemos a experiência. O homem conhece a felicidade por relatos. Por obscuros relatos interiores. A felicidade não pode estar no futuro, porque vamos sempre buscá-la às recordações, trazemos a sua imagem na memória. A felicidade é algo que aconteceu uma vez. Recordamo-la tão intensa e longinquamente que pertence sem dúvida ao passado da espécie. Mas tudo isto se confunde de forma automática e trasladamos o que é apenas uma vaga recordação para um hipotético futuro. A dita felicidade é inexequível precisamente porque a estamos a recordar. Foi.» (Pag. 163)
In:
«MORTAL E ROSA»
Francisco Umbral
Ed. Campo das Letras